Luah S. Fontana Luah S. Fontana

Quando eu era pequena

Quando eu era pequena, decidi que seria escritora. Não tinha bem certeza do que isso queria dizer, mas era fiel ao meu caderno da loja de R$1,99 e às canetas de gel que eu comprava para o início do ano letivo.

Percebi muito cedo que poderia criar universos infinitamente mais divertidos do que este daqui.  Compreendi, com a ajuda dos meus pais e avós, que palavras não eram “apenas” palavras, e que uma vez que elas saíssem da boca, nada as trariam de volta, e poucas coisas poderiam amenizar a dor de uma palavra que machuca.

Com bastante frequência, costumo contar histórias que começam com essas palavras: “quando eu era pequena”. Já me acusaram até mesmo de ser uma acumuladora de memórias e confesso que não pude discordar. Coleciono-as, guardo-as em caixas velhas de presentes, encho gavetas com elas, e escolho as que mais tocam meu coração para andarem comigo no meu bolso da frente. Volta e meia, encontro uma pausa nos diálogos com amigos e preencho com alguma dessas memórias—mas somente se julgo relevante no momento.

A  verdade é que não sei viver sem contar histórias. Entendo a vida como um enorme e interminável livro, daqueles que você quer muito ler, a trama é original e envolvente e você não quer termina-lo. Não exatamente. Você quer espiar o que a última página reserva mas sem que isso influencie a forma como você irá ler o resto do livro. Sem que isso pese em seus julgamentos dos personagens de alguma forma.

Claro, a diferença é que a página final de um livro existe, é palpável, você pode inclusive sentir o cheiro dela—aquele cheiro que escritor ama—e quando termina, você fecha o livro, talvez de maneira sentimental abrace-o com força rente ao peito como se a história fosse durar um pouco mais se você segurasse firme.

Na vida, não podemos espiar a última página. Podemos ler e reler várias delas, mas também não podemos viver o que já vivemos, não da mesma forma.

Por isso me agarro às memórias que tenho, e, para minha sorte, o meu ramo é os das memórias colecionáveis, das histórias que precisam ser compartilhadas.

Escritores trabalham com saudade. Não senti-la torna tudo muito mais difícil.

Quando eu era pequena, criei um mundo ao meu redor e venho vivendo nele desde então. Nunca tenho certeza se o que vivo é realidade ou ficção, mas raramente deixo que isso me incomode.

Agora, que já não sou mais pequena, torço para que o que me fez ser quem sou, não desapareça—por isso cuido, como quem cuida de livros para não mofarem—e carrego comigo uma caneta tinteiro que mancha minhas mãos de tinta preta. Assim, quem sabe, eu não esqueça de nada.

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Never dull.

Never dull, just sparks.

aching sharp on my broken parts.

Never dull, just sparks.
aching sharp on my broken parts.
Never trite, all art;
Polish your ego on my worn out heart.
Watch galaxies move from a random rooftop.
Untangle my knots until I beg you to stop.
Lay in the sun, rise with the moon;
(This is the way my world ends—)
not with a whimper, but with a boom.

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Melancolia

Moro nos momentos que antecedem a melancolia. No hálito fresco, na pele quentinha, no cabelo recém escovado. Na euforia de viver algo novo.

Moro nos momentos que antecedem a melancolia.

No hálito fresco, na pele quentinha, no cabelo recém escovado. Na euforia de viver algo novo. Em uma conversa animada entre um gole e outro de café. No delírio de andar em uma rua movimentada de mãos dadas com o caos, procurando um canto para pousar, para prosear, para descansar as pernas nervosas que, em espasmos, levam longe e para outro lugar.

Vivo ali, no segundo antes do voo. Na última olhada pela janelinha, pés suspensos, a respiração presa, o ar pressurizado, o estranho tentando fazer amizade do meu lado.

Acordo e durmo bem aí, na hora antes da hora certa, na noite anterior à destruição, vejo tudo acontecer de perto e vou embora logo porque meu coração não suporta a permanência pacífica, promissora, pendente.

Reticente porém rápida, a saudade chega mas eu já me vou.

Recuso o sentido.
Recuso sentir.
Melancólica, moro e morro aqui.

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101-N

I’m gonna teach you how to love me

Slowly, on a road trip down the coast.

I want to show you how to tame me—along with all of my ghosts.

“I’m gonna teach you how to love me
Slowly, on a road trip down the coast.
I want to show you how to tame me—along with all of my ghosts.

You beg me to guide you through me (as if souls were streets on a map).
So you can hit all of my green lights
So you can bend me until I snap;

You’ll take me to where the waves are crashing. To where marigolds blend with the sky
To wash off all of our sins.
To pretend you’re a little bit mine.

I will teach you how to love me:
every curve and every stop sign
You’ll believe you’ve finally tamed me.
And I’ll let you, one last time.”

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Not down on any map

“...it’s not down on any map. True places never are.”

Li isso em uma cópia de Moby Dick que comprei na biblioteca pública de SF por $1, no meu primeiro ano de faculdade.

“...it’s not down on any map. True places never are.”

Li isso em uma cópia de Moby Dick que comprei na biblioteca pública de SF por $1, no meu primeiro ano de faculdade. Assim, fora de contexto, lembro de ter achado a frase tão poética, que sublinhei ela, com caneta mesmo. Será que Melville via toda poesia que eu vejo nessa frase tão curta?

Penso nela toda vez que conheço lugares que me tiram o ar, que acendem uma luz na minha alma que, por um motivo ou outro, costumo deixar apagada.
Penso no tanto de lugar que conheci que, apesar de estarem representados de uma forma literal em algum pedaço de papel ou aplicativo qualquer, são “intraduzíveis.” Como coloco um alfinete em cima de tudo o que senti ali, naquele lugar, quando não foi o lugar em si que me causou tudo isso?

Quantos lugares existem dentro de mim, sem endereços exatos. Depois de vivê-los, ouvi-los, senti-los intensamente, posso defini-los com um carimbo no passaporte, porque talvez isso me torne mais “cool”? Lugares de verdade raramente estão em mapas. Uma vez que os conhecemos, os guardamos dentro de nós, juntos com os cheiros, as cores, os sons. Lugares de verdade vivem e morrem em nossa memória. Posso revisitar qualquer cidade agora mesmo, e jamais precisei de mapa para isso.

Lugares de verdade não são lugares, mas sentimentos que despertam em nós vontades que já haviam morrido; que levantam os pelos dos braços, que nos fazem chorar de alegria. Dispenso mapas—a verdade é que há tempos me perco em lugares e eles se perdem em mim. Ando por suas ruas sem rumo certo ou destino final, tiro fotos mentais, sinto medo de não conseguir voltar, mas volto. Penso “Foi lá naquele lugar, ouvindo uma flauta bamboo em um ritual qualquer que senti-me tão feliz que parecia que meu coração iria explodir.” Sei de onde estou falando...não posso apontar exatamente onde foi...mas senta aqui comigo que te conto tudo a respeito.

Te conto sobre as pessoas, a comida, sobre como cantam os pássaros por lá e se é diferente daqui; te conto sobre o que vi, vivi e ouvi.
Não sei bem onde era, porque não estava em nenhum mapa.
Lugares de verdade nunca estão.

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writers don't write.

Words aren’t written.

They’re often bled onto paper and ripped —whispered into thin air

never to be seen or heard of again.

•Words aren’t written.
They’re often bled onto paper and ripped —whispered into thin air
never to be seen or heard of again.
Words aren’t written. Although I hear pencil scratches on my skin
Every night.
Words aren’t written. They’re incinerated —and writers don’t write, they set fire.
Words burst out of pencil tips
Of finger cramps
Of tired brains
Of black tears running down the faces of those we call insane.
Words change:
Courses of action, nations, minds, and motifs.
and they convert
sinners into saints.
But words aren’t written.
And writers don’t write. •

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